Por ocasião dos 30
anos do falecimento de Joaquim Pedro de Andrade (1932-1988), o IMS Paulista
exibe, a partir de 6 de setembro, uma mostra dedicada ao diretor. A retrospectiva abarca a sua filmografia
completa em película, composta por 14 títulos. Todos os filmes serão exibidos em cópias restauradas em 35 mm. Em cartaz até 23 de setembro, a programação
evidencia as várias facetas da obra de Joaquim Pedro, diretor que, em
diferentes formatos e estilos, se dedicou a refletir sobre as contradições do
Brasil.
A mostra começa no
dia 6 de setembro, às 19h, com a exibição de Guerra Conjugal (1975); após a
sessão, haverá um debate com o montador do filme, Eduardo Escorel e a
pesquisadora Luciana Corrêa de Araújo, professora da UFSCar, que dedicou seu
doutorado à obra de Joaquim Pedro. Outro destaque é a aula sobre Macunaíma
(1969), ministrada por Carlos Augusto Calil, docente do departamento de cinema
da ECA-USP. A aula será realizada no dia 13 de setembro, após a projeção do
filme, marcada para as 19h.
A programação
ainda inclui, no dia 21 de setembro, o evento de lançamento do livro O
imponderável Bento contra o crioulo voador, roteiro nunca filmado de Joaquim
Pedro, publicado pela editora Todavia. O lançamento começa às 19h30, com a
projeção de dois curtas do cineasta: Brasília, contradições de uma cidade nova
(1967) e Vereda tropical (1977). Após a sessão, haverá um debate com Eliane
Robert Moraes, professora do Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas da FFLCH-USP,
e Carlos Augusto Calil.
A renovação da
filmografia do diretor foi o resultado de um projeto de restauração da sua obra
completa, iniciado em 2003, com apoio da Petrobras. Os filmes, que apresentavam
problemas como manchas, rasgos e riscos, foram recuperados em um processo de
ampla organização, que gerou um box de DVDs, 14 internegativos e 70 cópias em
35 mm, que hoje podem circular e ser exibidas em mostras como essa do IMS.
P R O G R A M A Ç Ã O
6 de
setembro
19h Guerra conjugal
Sessão
seguida de debate com Eduardo Escorel e Luciana Corrêa de Araújo
7 de
setembro
18h00 Garrincha,
alegria do povo
19h30 O padre e a moça
8 de
setembro
18h
O mestre de
Apipucos
O poeta do castelo
Couro de gato
Cinema novo
Os
quatro curtas-metragens são exibidos, um após o outro, na mesma sessão
19h30 Macunaíma
9 de
setembro
18h
Brasília,
contradições de uma cidade nova
A linguagem da
persuasão
Vereda tropical
O Aleijadinho
Os
quatro curtas-metragens são exibidos, um após o outro, na mesma sessão
20h Os inconfidentes
13 de
setembro
19h Macunaíma
Após
a sessão, haverá uma aula sobre o filme com Carlos Augusto Calil
14 de
setembro
19h30
O mestre de
Apipucos
O poeta do castelo
Couro de gato
Cinema novo
Os
quatro curtas-metragens são exibidos, um após o outro, na mesma sessão
21h O homem do
pau-brasil
15 de
setembro
17h45
Brasília,
contradições de uma cidade nova
A linguagem da
persuasão
Vereda tropical
O Aleijadinho
Os
quatro curtas-metragens são exibidos, um após o outro, na mesma sessão
19h30 Guerra conjugal
18 de
setembro
19h00 Garrincha,
alegria do povo
20h30 O padre e a moça
21 de
setembro
19h30
Vereda tropical
Brasília,
contradições de uma cidade nova
A
exibição dos dois curtas faz parte do evento de lançamento do livro O
imponderável Bento contra o crioulo voador. Após a sessão, haverá um debate com
Eliane Robert Moraes e Carlos Augusto Calil.
22 de
setembro
19h30 Os inconfidentes
23 de
setembro
19h30 O homem do
pau-brasil
S I N O P S E S
O mestre de Apipucos
Joaquim Pedro de Andrade | Brasil | 1959, 8', 35 mm
– Cópia restaurada
Com
roteiro estruturado sobre textos de Gilberto Freyre, o filme documenta o
cotidiano do sociólogo em sua casa em Apipucos. O mestre de Apipucos e O poeta
do Castelo, estreia de Joaquim Pedro de Andrade na direção, foram originalmente
concebidos como um mesmo curta-metragem. A pesquisadora Luciana Corrêa de
Araújo argumenta que o filme se construiria não apenas na oposição entre as
personalidades filmadas, mas na diferença de linguagem entre as partes. “A
primeira parte, dedicada a Gilberto Freyre”, escreve Araújo, “aproxima-se da
linguagem do cinema mudo, deixando bem marcada a ligação entre os planos a
partir de analogias, gestos, olhares que costuram as diversas atividades na
rotina do sociólogo. Já os planos com Manuel Bandeira se articulam, sobretudo,
pela continuidade das ações. São duas estratégias, ambas vinculadas à decupagem
clássica, acionadas de maneira a servir os propósitos do cineasta na abordagem
dos dois escritores. A continuidade, nos planos de Freyre, reforça a
caricatura, a postura autoritária do senhor de engenho em meio a suas
propriedades; nos planos de Bandeira, acentua o despojamento e a harmonia do
poeta com seu mundo.” Sobre a divisão dos filmes, Joaquim Pedro relatou:
“Parecia que o Gilberto era um ricaço e o Manuel não tinha um tostão. Isso
aborreceu o mestre Gilberto, que escreveu um artigo chamado ‘Esnobe da
riqueza?’, reclamando. A partir daí, separei os filmes para evitar esse tipo de
resultado.”
O poeta do Castelo
Joaquim Pedro de Andrade | Brasil | 1959, 10', 35
mm – Cópia restaurada
“Há
seis anos, cercado de refletores, cabos, trilhos e uma equipe de filmagem que
se mexia nervosamente em seu pequeno apartamento, Manuel Bandeira descobriu que
era um bom ator”, escreveu Joaquim Pedro de Andrade para o Suplemento Literário
do Diário de Notícias, em 17 de abril de 1966. O diretor filma o padrinho e
amigo Manuel Bandeira em seu cotidiano. Lidos pelo poeta, seus versos
acompanham e ressignificam os gestos banais de sua rotina no pequeno
apartamento em que vivia, no centro do Rio. No mesmo texto, o diretor diz
ainda: “Se eu pudesse hoje fazer outro filme sobre Manuel Bandeira, não lhe
pediria, como fiz antes, para que representasse o seu personagem diante da
câmera como se ela não existisse. A técnica do cinema direto, desenvolvida
recentemente, pôs bem a descoberto o artificialismo desse processo usado nos
documentários posados tradicionais. Mesmo assim e ainda agora, acho que os
dados da composição do filme, talvez por serem tão aparentes e declarados,
funcionam como a proposição de um jogo, como na obra de ficção, e armam um
processo eficiente para apreender e transmitir uma impressão verdadeira, ou
pelo menos sincera, sobre o poeta filmado.”
Couro de gato
Joaquim Pedro de Andrade | Brasil | 1960, 12', 35
mm – Cópia restaurada
Quando
o carnaval se aproxima, os tamborins não têm preço. Na impossibilidade de outro
material, o instrumento é feito com couro de gato. O curta se tornou um
episódio do filme Cinco vezes favela em 1962; antes disso, recebeu o Prêmio de
Melhor Filme no Festival de Sestri Levante, na Itália, e, em 1995, fez parte da
seleção Um século de cinema, do Festival de Curtas-Metragens de
Clermont-Ferrand, na França, onde foram exibidos 100 filmes curtos que fizeram
a história do cinema.
Garrincha, alegria do povo
Joaquim Pedro de Andrade | Brasil | 1963, 58', 35
mm – Cópia restaurada
Em
1960, Joaquim Pedro deixou o Brasil para uma temporada de estudos na Europa e
nos EUA. Realizou em Nova York um estágio na produtora dos irmãos Albert e
David Maysles, figuras centrais do cinema direto, um estilo de documentário que
buscava registrar personagens e contextos sem interferir ou encenar situações.
O gênero guarda algumas semelhanças com o cinéma vérité (em português: cinema
verdade), preconizado na mesma época por Jean Rouch, na França, que também
considerava a própria interação entre equipe de filmagem e personagens como
parte da construção de um filme. Em 1962, quando Joaquim Pedro voltou ao
Brasil, foi convidado a dirigir um documentário sobre o jogador Mané Garrincha.
Integrante da seleção brasileira de futebol, Mané foi campeão mundial nas copas
de 1958 e 1962, mas ganhou particular destaque nesta última, quando Pelé se
machucou logo no primeiro jogo, e Garrincha foi protagonista em campo. A
proposta era fazer um filme nos moldes do cinema direto, mas a ausência de
equipamentos adequados modificou o projeto inicial, e o documentário foi
realizado principalmente a partir de imagens de arquivo. No livro Revisão
crítica do cinema brasileiro, Glauber Rocha relaciona o filme ao cinema novo:
”Analisar Garrincha oferece os dados finais para concluir um capítulo sobre as
origens do cinema novo no Brasil; dispensa ao mesmo tempo, diante do próprio
filme, perguntas e respostas precipitadas sobre o que é este cinema novo. Garrincha
é o novo cinema nacional, assim como Vidas secas e Sol sobre a lama. Poderia
caracterizá-lo como um cinema de autor realizado numa expressão
técnico-estética, em que ideia e mise-en-scène significam um corpo ativo de
realismo crítico. [...] Garrincha é um tipo de cinema verdade, e não cinema
verdade como um tipo de cinema. Exigindo um rigor terminológico, eu proponho o
cinema de autor como cinema verdade: para situá-lo como síntese do cinema
novo.”
O padre e a moça
Joaquim Pedro de Andrade | Brasil | 1965, 90', 35
mm – Cópia restaurada
Em
seu livro Versiprosa, Carlos Drummond de Andrade escreve, sob o título “Em
preto e branco”: “O padre e a moça no cinema./ Emoção mais funda quem há de/
sentir ante este filme-poema?/ Salve, Joaquim Pedro de Andrade!” Livremente
inspirado no poema “O padre, a moça”, de Drummond, o primeiro longa-metragem de
ficção de Joaquim Pedro de Andrade se passa em uma pequena cidade em Minas
Gerais, na qual Mariana (Helena Ignez) se apaixona por um padre (Paulo José)
recém-chegado em missão sacerdotal. No entanto, Honorato, homem mais rico da
cidade, tenta proibir a relação e se casar com a moça. Nas palavras do diretor:
“O padre e a moça é um filme de crise. Fui ficando cada vez mais sensível, ou
atraído, por uma espécie de verdade nuclear na linguagem do cinema, nos
assuntos tratados. Não queria perfumaria, nem falsas verdades, nem efeitos
fáceis, nem nada disso. Fui chutando isso tudo pra corner. Então fiz O padre e
a moça, um filme sobre a inibição, um filme amarrado, de negação; um filme todo
criado por negação. Os planos são todos estáticos; o padre é um personagem
quase mudo. O fato mesmo de eu ter escolhido um padre vem do manto de inibição
que cobria aquele padre, que o impedia de transar com a vida de uma mulher mais
aberta. E tudo isso integra o filme, está na base. É um filme em que não
aparecem crianças, todo mundo é meio feio, muito torto. É um filme sobre o
negativo.” Em 1966, o filme recebeu os prêmios de Melhor Direção, no Festival
de Teresópolis, Melhor Fotografia, no Festival de Brasília, e o Prêmio de
Qualidade do Instituto Nacional do Cinema. No mesmo ano, a estreia do filme foi
marcada por um extenso embate com a censura, após reação de “autoridades
eclesiásticas e de membros da tradicional família mineira”, como aponta
pesquisa de Leonor Souza Pinto.
Cinema novo
Improvisiert und zielbewusst
Joaquim Pedro de Andrade | Brasil | 1967, 30', 35
mm – Cópia restaurada
Para
Joaquim Pedro de Andrade, “este filme é mais uma prova do crescente interesse
que os filmes do novo cinema brasileiro vêm despertando no exterior, sobretudo
na Europa. Foi produzido e narrado por K.M. Eckstein para o Canal 2 da
televisão alemã, funcionando como abertura e introdução para uma série de projeções
de filmes de longa-metragem brasileiros, que atingiram grande número de
espectadores europeus. Eckstein, que, em geral, além de produzir, também dirige
seus filmes, preferiu neste caso entregar a um de nós a realização de
Improvisiert und zielbewusst – literalmente Improvisação com objetivo
determinado –, fazendo assim do próprio filme-reportagem uma informação a mais
sobre o cinema novo brasileiro.” A versão brasileira do documentário, exibida
nesta retrospectiva, teve patrocínio da Cinemateca do MAM, narração de Paulo
José e texto de Maurício Gomes Leite. Com uma câmera Éclair 16 mm e um gravador
Nagra, Joaquim Pedro acompanhou o processo de realização de seus colegas
cineastas entre a filmagem de Terra em transe, de Glauber Rocha, a montagem de
A opinião pública, de Arnaldo Jabor, o roteiro de Garota de Ipanema, de Leon
Hirszman, a dublagem de Todas as mulheres do mundo, de Domingos de Oliveira, e
o lançamento de A grande cidade, de Cacá Diegues.
Brasília, contradições de uma cidade nova
Joaquim Pedro de Andrade | Brasil | 1967, 23', 35
mm – Cópia restaurada
O
filme reúne imagens de Brasília seis anos após sua inauguração e entrevistas
com habitantes de diferentes extratos sociais. Uma pergunta estrutura o
documentário: uma cidade inteiramente planejada, criada em nome do
desenvolvimento nacional e da democratização da sociedade, poderia reproduzir
as desigualdades e a opressão existentes em outras regiões do país? “A Olivetti
convidou Joaquim Pedro para realizar um filme sobre Brasília e pediu que eu
colaborasse com ele no roteiro, porque tinha morado na Novacap em 1965, quando
era professor da UnB”, escreve Jean-Claude Bernardet, corroteirista e
assistente de direção. “Falaram do interesse do diretor da Olivetti em produzir
um filme de curta-metragem sobre a nova capital, disseram que tínhamos total
liberdade, mas que deveríamos submeter-lhes o roteiro, que seria também enviado
à Itália. Acrescentaram que não tínhamos que mostrar máquinas de escrever nem
apresentar a loja da Olivetti em Brasília.” Segundo Bernardet, após uma mudança
nas escalas de comando da Olivetti, o filme foi rejeitado pela empresa, que não
queria problemas com o governo militar. Sem que tivesse sido anunciado, o filme
foi exibido no Festival de Brasília, em 1967, no qual Joaquim Pedro recebeu uma
menção honrosa. No dia seguinte à sessão, conta Bernardet, “Joaquim foi
procurado por alguém, que o informou de que seria preferível não apresentar o
filme à censura, pois não obteria o certificado e poderia haver consequências
mais graves”. A cópia foi depositada na Cinemateca do MAM, no Rio de Janeiro.
Macunaíma
Joaquim Pedro de Andrade | Brasil | 1969, 108', 35
mm – Cópia restaurada
Macunaíma,
uma adaptação da rapsódia de Mário de Andrade, é a história de um anti-herói,
ou "um herói sem nenhum caráter", nascido no fundo da mata virgem.
Preto vira branco, troca a mata pela cidade, onde vive acompanhado de seus
irmãos. Segue um caminho zombeteiro, conhecendo e amando a guerrilheira Ci e
enfrentando o vilão milionário, Venceslau Pietro Pietra, para reconquistar o
amuleto que herdara de Ci, o muiraquitã. “Escrevi duas adaptações, que me
consumiram quatro meses, mais ou menos de fevereiro a junho de 1968. Na
primeira, eu tentava racionalizar, de certa forma domar o livro. Mas as coisas
colidiam. Iam em várias direções, e não se completavam. Já na segunda, quando
entendi que Macunaíma era a história de um brasileiro que foi comido pelo
Brasil, as coisas ficaram mais coerentes e os problemas começaram a ser
resolvidos uns atrás dos outros. [...] Procurei fazer um filme sem estilo
predeterminado. Seu estilo seria não ter estilo. Uma antiarte, no sentido
tradicional da arte. [...] Não existem nele concessões ao bom gosto. Já me
disseram que ele é porco. Acho que é mesmo, assim como a graça popular é
frequentemente porca, inocentemente porca como as porcarias ditas pelas
crianças.” (Joaquim Pedro de Andrade, material de divulgação para o lançamento
comercial do filme, 1969). Naquele ano, a censura exigiu classificação
indicativa de 18 anos e impôs 15 cortes ao filme, a maior parte referente a
nus, a palavrões e ao texto “Muita saúva e pouca saúde, os males do Brasil
são”. Joaquim Pedro conseguiu negociar e reduzir o número de cortes. 10 anos após
seu lançamento, Macunaíma foi relançado nos cinemas sem cortes e recomendado
para maiores de 16 anos. No cartaz, a frase “Aaai que preguiça!!!” foi
substituída por “Agora sem cortes!!!”.No Festival de Brasília de 1969, o longa
recebeu os prêmios de: Melhor Ator (Grande Otelo), Melhor Coadjuvante (Jardel
Filho), Melhor Argumento (Joaquim Pedro), Melhor Roteiro (Joaquim Pedro),
Melhor Diálogo (Joaquim Pedro), Melhor Cenografia (Anísio Medeiros) e Melhor
Figurino (Anísio Medeiros). Em 2004, sua cópia restaurada e sem cortes foi
exibida no Festival de Cannes, na mostra Cannes Classics.
A linguagem da persuasão
Joaquim Pedro de Andrade | Brasil | 1970, 9', 35 mm
– Cópia restaurada
Quando
José Carlos Avellar foi convidado pelo Senac para escrever o roteiro deste
filme, ele era colega de Joaquim Pedro, ambos davam aula na Cinemateca do MAM.
“Do que escrevi, lembro só da preocupação de contar o filme como se ele já
existisse e de algumas imagens que sugeri (um painel diante de uma favela com o
slogan “isto faz um bem!”, por exemplo). Entreguei o texto à produtora, e dias
depois Joaquim me disse que havia sido convidado para dirigir A linguagem da
persuasão. Combinamos que depois, durante a montagem, eu escreveria o texto de
narração, seguindo as indicações do roteiro. Na moviola, depois de ver o filme
quase pronto, conversamos sobre uma primeira versão do texto de narração, que
Joaquim encontrou mais parecido com o tom de uma crítica de cinema que de uma
narração. A moviola usada para a montagem foi a da Cinemateca, por isso as
lembranças se misturam, o curso, a cinemateca, o cinema, o filme. Na verdade,
durante o curso na Cinemateca falávamos de cinema todo o tempo, e não tenho na
memória conversas específicas sobre este trabalho, que escrevi sem imaginar que
seria filmado por Joaquim e que ele dirigiu servindo-se do roteiro somente como
uma indicação para um filme curtinho sobre a linguagem da persuasão.”
Os inconfidentes
Joaquim Pedro de Andrade | Brasil | 1972, 100', 35
mm – Cópia restaurada
Segundo
Joaquim Pedro de Andrade, “toda a história da conspiração está vista a partir
da cadeia. O que corresponde, aliás, ao ponto de vista de todos os documentos
que existem sobre a Inconfidência.” Como referências, ele recorreu aos autos da
devassa, peças judiciais do processo movido pela Coroa Portuguesa contra os
inconfidentes, a O romanceiro da Inconfidência, de Cecília Meireles, e poemas
dos Inconfidentes Tomás Antônio Gonzaga, Alvarenga Peixoto e Cláudio Manuel da
Costa. “O trabalho do autor de um filme sobre a Inconfidência parte como um
inquérito sobre um inquérito, só que sem torpeza, para chegar ao que nos
interessa: um estudo do comportamento de presos políticos, especialmente
intelectuais de formação burguesa”, comenta o diretor. “Procurei abandonar a
definição convencional dos personagens históricos, para procurar a verdade de
sua humanidade contraditória, e explicitar constantes modernas da história.”
Guerra conjugal
Joaquim Pedro de Andrade | Brasil | 1975, 90', 35
mm - Cópia restaurada
Nas
palavras do diretor Joaquim Pedro de Andrade, Guerra conjugal “ilustra crônicas
de psicopatologia amorosa na civilização do terno e gravata, ainda vigente na
mitológica e ubíqua cidade de Curitiba, onde medram flores de plástico e
elefantes vermelhos de louça podem surgir a qualquer momento”. O filme é uma
adaptação de 16 contos de Dalton Trevisan, retirados não apenas do livro Guerra
conjugal, mas também de Novelas nada exemplares, Desastres do amor, O vampiro
de Curitiba, Cemitério de elefantes e O rei da terra. Por ocasião do lançamento
do filme, em 1975, Trevisan escreveu uma nota no jornal O Globo: “O belíssimo
filme de Joaquim Pedro me deslumbrou os olhos, alegrou o coração e edificou a
alma. Melhor que o livro é essa fabulosa obra-prima dirigida com garra, humor e
consciência crítica. Uma experiência inesquecível o filme Guerra conjugal. Foi
para mim e será para todos os que assistirem.” O longa foi exibido na Quinzena
dos Realizadores do Festival de Cannes de 1975 e, no Festival de Brasília do
mesmo ano, recebeu os prêmios de Melhor Diretor, Melhor Atriz e Melhor
Montagem.
Vereda tropical
Joaquim Pedro de Andrade | Brasil | 1977, 18', 35
mm – Cópia restaurada
“Amo
melancias. Gosto de possuí-las ao fim da tarde, quando vem chegando a penumbra,
de pé, sobre a mesa da cozinha, no sofá, onde é mais aconchegante, ou deitado
no tapete da sala, onde podemos rolar de um lado para o outro.” Assim começa o
conto “Vereda tropical”, de Pedro Maia Soares. O curta-metragem de Joaquim
Pedro de Andrade é parte do longa Contos eróticos, uma produção de César Mêmolo
Jr., baseado em histórias premiadas no Primeiro Concurso de Contos Eróticos,
lançado pela Editora Três e patrocinado pela revista Status, em 1976. Outros
contos que se tornaram episódios no longa são: “Arroz e feijão”, “As três
virgens” e “Arremate”, dirigidos, respectivamente, por Roberto Santos, Roberto
Palmari e Eduardo Escorel. O curta de Joaquim Pedro, porém, foi proibido quase
inteiramente pela censura e exibido às plateias brasileiras somente nos anos
1980, quando já havia sido projetado na Quinzena dos Realizadores do Festival
de Cannes e, em Nova York, no Festival New Directors/New Films. Sobre o curta,
Joaquim Pedro escreveu: “Crônica de uma tara gentil, encontro lírico nas
veredas escapistas de Paquetá, imagética verbalização e exposição
vergonhosamente impudica das fantasias eróticas, Vereda tropical contém a
denúncia da vocação genital dos legumes, a inteligência das mocinhas em flor, o
gosto da vida e a suma poética de Carlos Galhardo. Educativo e libertário.”
O Aleijadinho
Joaquim Pedro de Andrade | Brasil | 1978, 22', 35
mm – Cópia restaurada
Documentário
sobre a vida e a obra do escultor Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho.
Nascido em 1738 na antiga Vila Rica, hoje Ouro Preto (MG), cedo se tornou
conhecido pelas concepções técnicas que introduziu em seu ofício de escultor.
Além das obras realizadas em Ouro Preto, trabalhou também em Tiradentes,
Congonhas do Campo, Sabará, Mariana e outras cidades vizinhas. O roteiro é
assinado por Lúcio Costa e a narração é de Ferreira Gullar.
O homem do pau-brasil
Joaquim Pedro de Andrade | Brasil | 1981, 112', 35
mm – Cópia restaurada
Em
uma entrevista com Joaquim Pedro de Andrade para a edição de 5 de maio de 1982
do Jornal do Brasil, o crítico José Carlos Avellar apresenta aquele que seria o
último longa-metragem do diretor: “Montagem descontínua de cenas livremente
imaginadas a partir da vida e dos livros de Oswald e de seus companheiros do
Modernismo, da antropofagia e da poesia pau-brasil, este filme que Joaquim
dedica a Glauber Rocha começou a nascer em 1969, ainda durante a filmagem de
Macunaíma, quando a personalidade ‘desvairadamente polêmica’ do escritor
começou a interessá-lo como um contraponto de Mário”. “Dois atores, um homem e
uma mulher, Flávio Galvão e Ítala Nandi, para representar Oswald – ‘não a
figura dele, mas o que emanava dele’, como acentua o diretor –, os dois todo o
tempo em cena, como se o protagonista tivesse duas imagens paralelas. Dois
atores lado a lado para um personagem só. E um conjunto de cenas soltas. A
rigor, não existe no filme uma história, algo que possa ser contado, mas sim um
conjunto de ações soltas em torno da vida intelectual entre nós depois do
Modernismo. Cenas soltas e desequilibradas, que se encontram só no idêntico tom
de irreverência e descontinuidade.” Ao fim da matéria, Joaquim Pedro comenta:
“Eu me interesso de um tempo para cá por coisas que aparentemente não dão um
filme. É uma provocação que a gente se faz para cair num terreno cheio de
obstáculos, mas divertido e criativo. Foi um pouco assim que fiz o Oswald. Não
estou mais interessado no cinema como instrumento, mas sim no cinema como
objetivo. E, como Oswald, mais aberto, desarmado e solto na maneira de compor a
conversa. “Exibido no Festival de Brasília de 1981, O homem do pau-brasil
recebeu os prêmios de Melhor Filme, Melhor Cenografia e Melhor Atriz
Coadjuvante, para Dina Sfat.
S E R V I Ç O
Retrospectiva Joaquim
Pedro de Andrade
de 6 a 23
de setembro de 2018
IMS Paulista
Av.
Paulista, 2.424 (próximo as
estações Paulista e Consolação do metrô)
Ingressos R$8 (inteira) e R$4 (meia)